26 de dezembro de 2009

Essa cara amarrada

Finjo que não.
Brigo contigo.
Não quero um abraço.
Dispenso um amigo.

Mas é só o meu jeito
De te trazer pra mim.
Mesmo sem ser direito
Levar a vida assim.

Ele não é de nada.
Essa cara amarrada é só
um jeito de viver na pior.
(Marcelo Camelo)

19 de dezembro de 2009

Sou

Vivo, sou.
Amo, quero.
Sei, posso.
Tenho, sinto.
Penso, existo.
Sou.

Haikai(zinho)

Falta de folha.
Nos amontoadinhos
Todos poemas

Dias quaisquer

O sol bate
É manhã
Vem o dia

O sinal bate
Já mais tarde
Vêm as aulas

O coração bate
Em companhia
Vêm os amigos

A fome bate
Sozinha
Vem o almoço

A porta bate
Em meio a nada
Vem a Liberdade

A saudade bate
Anoiteceu
Você não vem

O sono bate
Adormeci
Vêm os sonhos

O sol bate
É manhã
Vem tudo de novo

Comum

As histórias de amor são sempre
trágicas, impossíveis, perfeitas,
horríveis, diferentes, irreais e incomuns.

Porém, ele segurou sua mão,
puxando-a para fora da multidão qualquer.
Disseram "Eu te amo" e sorriram.
Sorriram o sorriso mais verdadeiro que se pode imaginar.

16 de dezembro de 2009

Trecho de "Furta-cor"

...

E quem há de julgar
as rimas pobres
Tão ricas de sentimento?
Estas, sim, existem só para ti

A flor

Fui até aquela lojinha humilde situada na esquina do cemitério. Talvez fosse feita para os familiares chorosos querendo prestar uma última homenagem, mas meu objetivo era outro.
Entrei, o cheiro de pólen invadindo meu nariz, e, logo de cara vi uma flor. Uma flor linda, uma rosa. Seria a escolha certa? Precisava ser uma flor realmente especial, uma que significasse muito para mim e, principalmente, para você. Será que aquela, pela qual havia me apaixonado à primeira vista seria boa? Talvez por isso ela fosse boa, já que me apaixonei à primeira vista por você. Poderia usar desse argumento no cartão. Aquele que iria junto com a rosa.
Com a rosa na mão, andei pelas ruas a caminho da sua casa. As poucas pessoas que passavam pela rua me olhavam com uma cara alegre, como se soubessem o que eu estava pronto pra fazer, como se me apoiassem. Eu sorria de volta, apenas, como se, em resposta a esse apoio, agradecesse e lhes garantisse que tudo ocorreria bem. Você morava perto, em menos de dez minutos eu já me via parado em frente a uma casa. Ela era branca, grande, linda e o quintal era verde. Apesar da noite escura, pela pouca luz dos postes, percebi que a grama estava mais verde do que aqueles dias em que eu costumava ir para te ver. Parecia perfeito o momento.
Subitamente, decidi que não precisava do cartão, lhe diria tudo o que havia escrito. E você acharia lindo. Me abraçaria, me beijaria e diria que me ama. Rasguei-o e enfiei no bolso. Entrei pelo portão que ficava sempre aberto, imponente e apaixonado. Andei pelo caminho que dividia o quintal gramado em dois.
Você passou pela janela. Linda, os cabelos molhados e de pijama. Provavelmente, acabara de tomar banho. Ficara ainda mais atraente assim. O medo me tomou e parei. Certamente, você não gostava de mim, já que só havíamos conversado algumas vezes e eu era, provavelmente, só um colega. Toda aquela segurança foi-se com a sua imagem passando na janela. Vi, naquela hora, o quão real você era e o quanto eu cobraria de você, declarando esse amor.
Readmiti a ideia do cartão. Vasculhando os bolsos achei um papel que serviria e uma caneta. Escrevi uma mensagem, tentando lembrar o que escrevera na outra, mas agora, com menos coragem, assinei apenas com a minha incial, "M". Você deveria lembrar ou, pelo menos, pesquisaria as pessoas com essa inicial, a fim de achar seu admirador secreto.
Depositei o ramo de flores no tapete que dizia "Bem-vindo". Sorri com os tais dizeres, que pareciam me apoiar também.
Virei as costas, a caminho de casa. Me arrependi e voltei a achar que tinha feito o certo durante toda a noite. Cogitei, certa vez, ir lá e retirar as flores, na esperança de você não ter visto, mas isso era impossível, pois eu havia tocado a campainha.
Deram-se algumas semanas sem notícias. Desejei que você tivesse esquecido, eu achava que fora um impulso impensado. Coisa de apaixonado solitário em uma noite bonita. Mas você não esqueceu.
Certa vez, algumas semanas mais tarde, você veio até mim num dos pátios da faculdade. Na verdade, veio até o grupo de amigos, mas eu só pude ver você, crente de que descobrira que eu
te dera a flor. Mas você não descobrira, ou achara que sim.
Nos apresentou seu namorado, que lhe conquistara com uma flor, uma rosa linda, com um cartão ainda mais belo. Um sujeito alto, bonito, olhos castanhos - que me pareceram sem poesia demais para uma declaração como a minha, com flor e tudo-o-mais - e um sorriso galante, meio de vencedor, como se soubesse que eu havia lhe entregado a mulher que seria minha.
Sonhei com você aquela noite. Você vinha a mim e dizia "Tua flor me deu alguém pra amar!" como se soubesse. Eu lamentava "Mas e quanto a mim? Você, assim... e eu, por final, sem meu lugar." Você sorria então, no sonho, e colocava algo no meu bolso.
Acordei e revirei a calça. Achei o bilhetinho, o rasgado.


Eu fiz de tudo pra ganhar você pra mim, mas mesmo assim...



PS.: Texto baseado em "A flor" do Los Hermanos.

O pacto

Mar denso.
Desbravável? Talvez.
Mas tenho medo
porque ele me carrega.

E se o corpo acompanha,
a alma fica
E se perde no grande mar.
Levada pelas ondas.

Mas, apesar do perigo
(apesar do final),
Faço esse pacto
e jogo meu barco ao mar.

PS.: Feito com o pensamento em uma possível - e assustadora - futura leitura de certo livro.

Estrela

Olha lá!
Na imensidão azul, negra
jaz tão pequenininha.
Tão solitária, delicada,
mas já tem luz própria.
E se pensar bem ela é enorme
De perto, só um corpo celeste que brilha.
Só?
Mas esquecei-lo
é tão bom vê-la daqui, brilhando.
Mágica! Linda!
Sabendo que, mesmo real,
é mágico ver tão perfeita
feitura da natureza.

PS.: Feito na cidade de Itatiba, onde, ao contrário de São Paulo, as estrelas são visíveis.

Hora Marcada

Quem foi que inventou o relógio?
Quem foi?
Mas pra quê se a conversa é boa?
Pra quê?

Você subverte a razão de ir lá
E arranja um motivo
Um motivo qualquer
Pra quê?

Você subverte a razão de ir lá
Eu tenho que
Eu tenho que
Pra quê?

Mas quem foi que inventou o relógio?
Pra quê?

PS.: ê, Maria Luiza :)

Trecho de "Céu aqui"

...

Mas eu, na minha condição
De mero (ou nem tanto) indivíduo
Afasto o que os outros pensam
Me atenho ao que é real
E crio um você só meu
Aqui dentro.

Versinho Fraterno

Todos iguais, todos leais
Todos demais, alguns animais
Todos em paz. Todos têm paz?
Mas obedecem sem dizer 'mas'

Pernas e braços,
em riste,
seguem os passos.
Pedem com urgência
Que o coração bata
Continência.

Ela, ele e eu(?)

Moro num apartamento. Quatro casas por andar, muitas vidas por andar.
A casa do lado tem uma jovem que toca piano. Ouço pelo banheiro. Às vezes vou até lá apenas para ouvir as melodias, que variam de Jazz até Erudita, e que, tão lindamente, ela dedilha com propriedade.
Já à minha frente mora uma mulher de meia-idade que quase não pára em casa. Sai de manhã, no mesmo horário que eu e volta só à noite, enquanto ponho o lixo pra fora.
Mas o que me chama a atenção é o casal de cima. Brigam todos os dias. O homem chega ao final da tarde em casa, ela reclama. Ela diz que ele é ausente e acusa-o de ter um caso com a secretária do escritório (ele é advogado).
Ele, por sua vez, insinua que ela tenha um caso com o Lázaro. Não sei quem é, mas ela diz que são grandes amigos e que ele está sendo idiota. Ele, então, a acusa injustamente de sair durante seu trabalho. Injustamente, sim! Ela não sai de casa, exceto pra ir ao mercado ou feira. Seria o tal Lázaro de lá? Ela parece usar meu argumento e responder à minha pergunta. Lázaro, o irmão dele, havia "roubado" a primeira esposa.
O auto-considerado traído sentou-se no pufe(ou no sofá, não sei) e estabeleceu-se o silêncio. Podia chorar, se lamentar ou apenas segurar sua raiva para não ser rude com a esposa. Qual fosse devia amá-la. Me comovi com a mágoa do homem. Pensei que ele deveria ser perdoado pela superreação.
Ouvi-o se levantar e, então, entregar-se às lágrimas. Tive certeza, agora, de que deveria perdoá-lo. Mas ele confessou a traição. Desmoronei, ela também. Esperei, e torci, para que ele se explicasse, dizendo quem foi, porquê ou quando, mas, dessa vez, ela não concordou comigo. Expulsou-o de lá, jogando uma mala (ou poderia ser uma caixa) no chão. Ela foi para a cozinha(que ouço pior que a sala) e chorou até que ele saísse.
Corri para a minha janela da sala. Ela também correu. Comovidas, choramos, juntas. Ele esperou na porta do condomínio até o primeiro táxi passar e foi embora para um hotel, talvez.
Deu-se algumas semanas e a moça se mudou, provavelmente prum apartamento menor. Não sei. Não sei se se viram depois do acontecido, não sei se se separaram ou recomeçaram tudo. Não sei se voltaram a ser amigos. Mas que me importa, né? Não sou dessas de ficar vendo vida dos outros...

Longe das cercas embandeiradas que separam quintais

Lá estava. Esquecera o antes e não pensava no depois. Não pensava em nada, ao menos, nada de possível compreensão.
Alguns meses atrás pensava como os outros. Enfurnado no pensamento comum, preso à uniformidade. Não sabia se gostava daquilo exatamente, mas se libertou daquela mentalidade, ou talvez tenha se fechado mais ainda. Mas, agora, não era revolucionário e nem diferente. Era ininteligível. Seu modo de ver as coisas era absurdo, anormal, não-padronizado e fascinante.
Dir-se-ia que era louco, se é que essa palvra, tão padronizada, poderia definí-lo. Ele estava, sim, além de qualquer palavra, definição ou esteriótipo.
Os normais... eles são tão normais, comuns, enquanto os loucos - ah, os loucos! - são todos diferentes e geniais. Cada um com sua genialidade única.
Agora, ele, o louco, o indefinível, encontrava-se parado, olhando para o nada, em nenhuma esperança de que nada pudesse acontecer. Parado, pensando, de sua forma extremamente peculiar, em tudo. E, assim como o daltônico vê o rosa semelhante ao cinza, o tudo e o nada se confundiam loucamente em sua mente febril. Murmurava algumas coisas cujo sentido só aquela lógica poderia ousar explicar.
As palavras reverberavam-se, rebatidas pelas paredes. Se houvesse um corpo, alguém sequernaquele lugar o som não voltaria para os ouvidos dele. As palavras eram ditas tão baixas que o corpo certamente as absoriviria. E a falta de nexo era tamanha que, fosse a mente desse alguém minimamente sensata, elas, as palavras, seriam completamente exploradas na vã tentativa de entendimento.
E como tudo lhe vinha à mente, desmaiou. Desmaiou como se nada lhe viesse à mente. Desmaiou como se seus pensamentos fossem tantos e tão geniais que não caberiam numa mente humana, limitada ou, também, como se fossem tão poucos e tolos que merecessem permanecer ali, em tal liberdade mental.
Só se sabe que, em meio a tamanha febre, desmaiou e não acordou mais.