19 de fevereiro de 2011

Blog

Penso o tempo todo em criar um blog pra contar das cotidianeidades dos meus dias, pra contar a cara de nãoseiquem que eu vi hoje ou a música nova que eu ouvi ontem, mas, então, eu penso que aquele blog seria reservado às verdades da minha vida, aos fatos, aos acontecimentos, o que acabaria resumindo este às mentiras (e eu teria que aceitá-lo). Por mais que todas as palavras aqui ditas sejam inventadas, devo dizer que há, essencialmente, somente verdades aqui, pois escrevo o que se aplica nas situações por certas visões. Depois de concluir isso, concluo, toda vez, que se eu viesse aqui lhes dizer meu cardápio do dia ou que horas fui dormir perderia-se todo o encanto de notar focos e coisas que me chamam mais a atenção e a vida seria homogênea demais. Então decidi ligar aquela teclinha 'foda-se', ignorar a minha vontade egoísta de querer compartilhar a vida a todo momento e de ter essa obsessão pela poesia que não me deixa andar sem achar o passo bonito.

A propósito, só tomei café hoje.
Foda-se.

18 de fevereiro de 2011

Formação

Liberdade quase plena. A válvula de escape, o sempre, o tudo, a base. Abraços desprogramados, a volta, a casa. A casa. Caminhar por ela num banho de afeto cujo vapor perdura. A lembrança. E toda vez que o pulmão e as pernas já velhos e fatigados, já certos e mastigados e devorados, perderem para a estrada, larga-se; cai; embaixo colos, choros, broncas. Opor-se àquela sociedade tão pneumática e limpa e devoradora. A sujeira, a paixão, o sangue e o medo. A casa.
E quando descansados e obesos, quando curiosos e instigados, andar. E ao andar, deixar a deglutição cujo alimento foi você. Devorado. Mas não, agora só andar. Andar, ver, tocar, saber, conhecer. As pedras, as paredes, as plantas e as vidas. O vento passar assobiando entre os vãos de seu corpo e junto dele levar o vapor, o cheiro e o pó. E tropeçar também. E ferir-se e correr. Mundo vasto mundo, deixe-se descobrir. Prostitua seus recursos brutalmente. E ferir.
Por fim, a fuga. Não a fuga do mundo, que seria absolutamente vã depois de ferido e sábio. Não a fuga de casa, que seria absolutamente estúpida depois de amado e alimentado. Por fim, a fuga de si. Momento de tirar aqueles restos grudados cuja proveniência nem se sabe. O vento deixou. O banho deixou. E você arranca vorazmente com as mãos, jogando longe. Pensar, gritar. Ler e ouvir e pensar. E ver! O mais bonito, o mais bruto e o mais pessoal dos lugares.
Em suma, três situações fundamentais. A formação diária do ser. Em suma, três razões pra não deixar que ninguém entre em mim. São três modos de compartimentar a vida. Três motivos. Somente três medos. As três coisas mais racionais que se tem. E são os três maiores obstáculos.

13 de fevereiro de 2011

O poeta

Veste-se com a mais grandiosa farda da soberania, os olhos sempre abaixo e o nariz erguido, você reserva uma parte da alma aos outros e entregando-a finge ofertar o todo. O fato, porém, é que volta a ser um bebê - e não de olhos enormes, mas um que o feche-os a chorar suplicando por algo - quando fala de seus pensamentos. É o que acontece toda vez que tenta ser superior a eles. Diminui-os. E todo pintor há de caber em sua pintura. Diminui-se. Um bebê que chora de olhos fechados. Suplica, achando-se correto, pois que pais - malvados! tiranos! - são esses que lhe negam o que você quer? Você suplica. Suplica aceitação. E pensa em como são geniais seus pensamentos. Só um bebê.
"Pra que tanta perna, meu deus, pergunta meu coração/Porém meus olhos/não perguntam nada." diz Drummond. Entende agora como ele cabe? Entende como não sabe? Percebe que os textos só são verdade por serem um não-saber infindo? Por isso é que todos se aplicam. Percebe? Escreva. Escreva agora o que sente e o que não sente. Escreva a verdade. Escreva sobre o que sabe e sobre o que não sabe. Escreva pois é o que pode a poesia sobre a ciência. Escreva! Escreva mais do que você e então se tornará mais. Então, crescerá, percebe? Crescerá pra ser um homem, bebê - um homem! Um homem livre de verdade.

9 de fevereiro de 2011

Cadê você?

Cheiro ok. Cor cinza. Gente-personagem.
Olhei pros lados imitando meus pais. Foi? Andei em linha reta fingindo uma rota. Sentei no lugar errado e a inércia me mandou aceitá-lo. Olhei pros lados atuando. Cocei o nariz atuando. Fingi fazer uma ligação. Ninguém atendeu. Fingi olhar as horas, mas não passavam. Atuei um caminhar até o banheiro. Fiquei um tempo na coxia e molhei as mãos ao sair. Eu não te vi e não percebi. Olhei pros lados imitando meu próprio gesto. Eu vi as pessoas erradas.
Medo. Insegurança. Sono.
Cadê você? Chegue logo, pois essas pessoas me enojam. Estão virando gente e eu preferia os personagens. Olhe o cabelo cor-de-fogo dela! Olhe aquela alma desperdiçada. Vejo uns sorrisos aqui em volta. Rimos todos, mas porquê? Escondendo-se na multidão fica mais fácil. Talvez se eu ficar quietinha e aqui e só esperar por você.
Curiosidade. Alívio. Imagem.
De onde você trouxe esse sorriso mona-lisa, moça? E esse cabelo anos 60, de onde? De onde vem essa concentração? Essa calma, de onde vem? Vêm todos de lá... vê, lá longe? Meu sorriso escancarado... meu cabelo bagunçado... minhas manias, meus trejeitos, minhas músicas, minhas roupas... cadê você?
Luz. Base. Contato.
Então, aí está! Venha pra cá, sim? Chegue mais perto! Quem é que é você? Você é isso que vejo ou você atua como eu atuei por todo esse tempo? Vê que tiro a máscara? Cadê você? Eu posso ver mais fundo... As pessoas reais são feias, pelo menos, mais feias que o personagem que atribuo a elas. Por que você é tão bonita? Será você mesma? Cadê você? Eu preciso dessa coisinha que você tem aí dentro e que me define! Vamos dividir?