20 de junho de 2011

Sobre estar em casa

Hoje eu vim de frente pro Sol
e ele sumia no horizonte.
A sombra no inverno é fria
e eu tinha que correr contra a rotação terrestre.

Pois foi o branco do Sol
e foi o branco do céu
que inundaram meus olhos
de todas as cores que o compõem.

Na cegueira, surgiram fortes
olfato, tato, paladar e audição.
Veio ainda mais um sentido
o mais útil: a memória.

É que meus pés desviavam
dos buracos do caminho todo
Minhas mãos sozinhas me rodavam
em volta de cada poste, dançando

Meu corpo cego sabia do atraso
que, calculado, me dava seis minutos
E meu cérebro criou uns versos livres
racionalizando o semanal e sublime.

8 de junho de 2011

Sobre a velha sala clichê para sentimentos inéditos

Vê?
Eu já até escrevo como em velhas baladas norte-americanas.
Os versos vão assim se amontoando sem ordem à qual se dê sentido.
E ao meio uns cigarros em cinzas. Os pés calçados de couro.
Pelo ar vem voando um jazz, empurrando a matéria, que sempre volta, como se insistisse em mudar de propósito. E não muda.
É o mesmo cenário e, nele, cadeiras de velha madeira, paredes de amarelo, o cigarro, eu estou lá, mas ausente. É, de fato, se me procurar, jogando os olhos a todos os lados, não estarei. Nem no espaço, nem no tempo.
Mas existo o infinito.
Enfim, é tudo somente mentira: o clichê de um filme antigo, que nem mesmo cores costumava ter. Ah, as paredes amarelas da nicotina e do tempo não mais, mas ainda o cigarro cinza.
Sou, se os autores nem mesmo me cogitaram?
Sou, se eu nunca vivi tão falsa e vulgarizada cena, mas se ainda comigo carrego
a solidão, o violão, a madeira, a cadeira, as velas, as amarelas, o jazz, os pés
que constituem esse sentimento que tem nome tanto quanto a desocupação repentina e a saudade do que não mais se gosta, e que tenho a liberdade, dada e recebida por mim, para sentir?

4 de junho de 2011

(In)existência

O mundo não é feito pra ser, creio, e, mesmo assim, todas as suas concretizações parecem perfeitas aos meus olhos humanos, que só sabem ver sombras. A eternidade, então, cabe só a Platão?, havendo, portanto, infindas existências a mais do que nessa foto (se seguirmos a ideia de que quantidades mínimas de tempo são desprezíveis) que presenciamos. Me parece, pois, que as coisas que me vêm à mente, e só a ela, trazem sempre falhas de acontecimento e talvez seja isso que faz permear a realidade como é. Mas talvez ainda a única das implicações seja a própria não-existência. É esse impasse de causa e consequência que não consigo resolver, senão por meios dedutivos, mas penso agora: não é tudo isso, ainda(?), uma enorme dedução?