17 de agosto de 2015

Violeiros no metrô

Fiquei de te apresentar meu silêncio
e nem te contei
dos violeiros no metrô
-você tinha que ver.
Fiquei de te apresentar
minha alegria gaguejada
de uma criança
que pela primeira vez
tivesse visto violeiros no metrô.

Se você ficar eu faço um café
Ovo mexido
Beijo no umbigo
não sei fazer mais do que isso.

Câncer

eu
do alto do meu cuidado sério
egoísta
você
mimimi inconsequente
brincadeira de afeição

você
atiçando meus quadris
eu
oh
please
don't watch me dancing

eu topo sem preocupação
cigarro, teu lábio
falta de ar
você não me ama,
mas ama me amar.

18 de abril de 2015

Maio

Esta aqui é uma semana eterna que se extende
e se extende.
Os sábados são descansos
tão previsíveis
tão botados à caneta no fim da semana
à régua no calendário 
que nem são descansos
E eu vivo de te esperar
acompanhada de uma previsão de ti tão densa
marcada tão fundo no meu coração
marcada à caneta no dia 22 do calendário
que temo que passe a longa semana
e quase temo te tocar. 
Até as notas fiscais
os manuais de eletrodomésticos
os ais das loucas cartas de amor
parecem cartões postais.

11 de janeiro de 2015

Nome de guerra

Um nome de terra
é o nome que significa Terra
E o homem que volta da guerra
traz na boca um nome de longe
de onde vem a terra de sua bota
de onde vem o sangue de sua roupa

Lá fora o mesmo chão,
este chão em que ele nasceu
tem um nome muito esquisito
que o homem nem sabe pronunciar

Aflito e sábio, ele conta
o mar chama Mar
a onda chama Onda
o céu chama Céu
o homem chama Homem
e o que não tem nome
nomeado está.

E o nome da terra de lá?, ele treme
O nome de lá é o mais terrível
que a nossa língua puder dar.

6 de janeiro de 2015

constante

Da janela do cômodo sempre fechado,
assisto a chuva que cai
na casa que nunca foi minha
e agora é.

A chuva se adensando
e a cor dos móveis familiares
As gotas riscando em branco a paisagem que eu nunca vi

Um raio roxo arde
no quadro que a janela permite
Um cachorro late assustado, ouço:
é o meu velho cachorro latindo assustado.

O céu não se distingue dos prédios
do mesmo e único céu
cai a mesma e única chuva
que assisti de tantas janelas

A água tamborila sem ritmo,
desembestada corre pelo vidro.
Todo ano em meu aniversário
espero a chuva cair sobre o ano que passa

E é a única constância que conheço.

30 de maio de 2014

frio

ao sair no sereno
nesse frio, nesse inverno
se empacote, sai seguro:
cachecol chicote
sobretudo escudo
pra domar o tempo
e o vento dançarino.

quando eu tô saindo:
-se agasalha, menino!

e açaí é suicídio

28 de maio de 2014

Lama

As coisas permanecem boiando
Na grossa camada de lama e caos
e caos e lama
Nunca em panos limpos:
A própria água brota da bruta camada

O que se mexe regurgita
Treme, agoniza, tenta um brilho suave
e regurgita
Viver é se dobrar.