23 de dezembro de 2011

Uma dessas histórias boy meets girl

Gelada e distante simpatia.
E pra fingir-se mais (idade? - como sempre faz, como sempre fez) desfaz a costura daqueles sonhos que a jovialidade lhe concede e deixa faltar um pedaço
Gelada e distante simpatia
Quase uma foto

Mas mesmo assim, sorriu, sonhou,
contou pra gente risonha e tudo o mais
Houve confusão, mas dessa vez
foi sem choro nem vela

Ficou em casa, mas devia era ter saído
encontrado alguém, encontrado todo mundo
mas só se fosse gente de verdade,
desses tão de verdade que você pode mentalmente espancar ou agarrar porque nunca vão chegar mais longe do que a pele permite...

"Sim, ele sabe pra onde os olhos vão todo fim de tarde.
Sei lá, só sabe." Idiotinha.

E eu sei lá se essa história faz mesmo algum sentido
já que todo mundo diz que é isso mesmo que falta ao amor
Se é amor, tampouco sabem eles dois - que vão dizer?
Sei que a letra dele me fez (como sempre faz, como sempre fez) escrever também
(qual história não é digna de ser pautada?)

e o grande objetivo disso tudo foi me lembrar da poesia de que tanto duvidei, por tanto tempo:

é um enredo tão contente, tão contente!!,
tão de livro, tão bonito,
estranhamente bonito,
tão esperado,
é a mentira que você quer acreditar
pelo bem do final do filme, pelos prêmios a ele dados
ou só porque o ator principal te atrai de todas as formas possíveis,
mas é mentira.
E tão bem contada,
e de forma tão bonita (toques, vejam só)
que, pela lei da celebração da verdade,
pela lei de todos os bons viventes,
aventureiros e anti-poetas,
descontenta.

27 de novembro de 2011

Deixar sair

Vou escrever sobre amor porque sinto,
no entanto, dispensarei qualquer bela foto de pôr-do-sol
Vou escrever só porque era ele
porque era eu:

Ou nem nada disso e sim porque
eu era ele era eu
pois só peguei no lápis mesmo
quando era só eu eu eu eu

Lábios óbvios: terei talvez
Olhos órbitas: de vez em quando
Braços omni: me contento do roubo

Sei que há nuvem mais alta e quero
deixe vir platão mas que vá embora logo:
quero me enganar só mais um pouquinho.
Por favor, só mais cinco minutos

Prometo que há lábios, olhos e braços
desses, sério!, de carne, te digo
prometo-lhes esse domingo,
essa segunda, essa terça
essa quinta e se vai

Da obviedade do reflexo do espelho, me consolo:
"é tudo sempre impressão, moça"
E do cara que pouco se importa, um conselho:
"saia da sua mente, moça, antes que seja tarde"

-

I never loved nobody fully
Always one foot on the ground
And by protecting my heart truly
I got lost in the sounds I hear in my mind
[R. Spektor]

21 de novembro de 2011

Eu quero uma pra viver

Pureza de quem conta retirantes,
de quem entrebombas registra
de quem chora e sangra no papel...

Não tenho fome.
Queridos mortos: um ou dois.

Não há tormento o bastante pra expressionismo
e sou mesmo meio sem talentos

Acho que vivo entre
um grito antes da vida e
um grito depois da morte
: não sou movimento

Não sou líder mundial - aos dezesseis, quem é?
nem sou cineasta brilhante - aos dezesseis, quem é?
meus versos são totalmente tortos
e odeio subestima baseada na idade.

sou
semi-comunista semi-atriz
semi-musicista semi-adulta
semi-europeia semi-semítica
semi-culta semi-simpática,

recorro às incertezas
o cotidiano
a imaginação e
a metafísica.

14 de novembro de 2011

Desconstruindo conjeturas

Faz tempo que eu venho esperando uma visita definitiva
Aliás, recentemente diminuí a expectativa: uma visita.
Percebi que antes era fácil,
e talvez um dia volte a sê-lo,
ser presenteado pela vida.
Tê-lo, admirá-lo, rasgar o embrulho e,
às vezes de um minuto ao outro,
notar que a existência é, enfim, outra
diferente da de outrora
diferente até daquela que eu podia fantasiar.

Eu tive uma dessas inspirações divinas pra escrever,
mas não tinha porra de divindade nenhuma nela
na verdade, era só o Pessoa,
e isso significa que eu vou continuar em dúvida.

Não.

Arranjei um drama ou outro
pra temperar a automaticidade dos dias,
deixar a adrenalina correr um pouco e
disfarçar o gosto ruim que fica da rotina.

Mas não.

O máximo que fiz,
e sei que esse foi um auto-presenteamento,
foi constatar que odeio as suposições,
que são, não por acaso, meu maior vício intelectual.

Fomentei, com egoísmo, a ideia de que.
Não, não: fomentei com egoísmo a ideia.
Celebrei a ideia, celebrei o ideal,
celebrei a vontade de pensar,
e o pensamento utópico.
Determinei que, não tivesse meus pensamentos profundos,
ninguém teria nada.
E, então, celebrei a sua negação,
comemorei nas vezes em que ele me contrariava,
e me apaixonei pelas antíteses.
Entendi a delícia do grito e me calei: queria ouvir.

Jogarei no lixo minha nicotina, meu álcool,
cuja versão amena é pior por não ser levada a sério:

"Ele não me serve porque não me pertence.
e não me pertence porque tem um mundo dele inteirinho, ao qual eu não pertenço."

"Friedrich bem disse que seu leitor não deve perguntar se a verdade é útil
e eu disse melhor ainda: é porque ela, se existe e eu a tenho, provavelmente não é."

"Não há mesmo borboletas: é tudo sempre previsível
e quando não se prepara de antemão, não vem a melhor sensação do mundo."

"Eu não vou ser uma dessas pessoas gigantes, cuja opinião converte só por ser
e eu odeio esse tipo de opinião, apesar de querer ser ouvida incondicionalmente."

E por fim, "ninguém nunca vai me ouvir
e tudo bem porque eu não tenho mesmo nada a dizer."

Talvez por isso ninguém me diga nada:
Eu não tenho nada a dizer.

13 de outubro de 2011

Passo

Não se sabe em que lugar ela estava, mas certamente não era o mesmo. Cada vez que levantava o pé, sentia que o mundo dava um salto pra trás dizendo 'pra quê esforço, minha jovem? andar ainda é fácil como parece ser.'

Andou na rua e achou um cara.

Mentira, nada é assim tão simples: com ela, vieram, pelo caminho, pessoas; umas à frente, umas atrás e umas, (a frente ou atrás) ao seu lado: coladas ou distantes. Acontece que os caminhos não são retos, bagunçam-se, estabilizam-se, correm e param, só não voltam.

Então, andou pelo seu caminho e topou com um cara. Foi uma esbarrada rápida e acho que talvez só tenha sido ela vendo ele passar correndo, mas atingiu-a em cheio.

Podia vê-lo lá longe correndo...
diminuindo...
diminuindo...

Esperou o passo do mundo. Foi birra, eu sei! Ele não recuou!

Queria correr atrás do cara e não era só isso: suas expectativas a ultrapassavam, seus amigos iam na frente estendendo a mão, mas sem parar de andar, o Mundo ria, sentiu a raiva.
Comum raiva, que aqui é detalhe, mas que às vezes não vai embora.

Virou pro mundo, 'se você não vai, vou eu.' e tropeçou porque não é a heroína dessa história e nem é essa história um filme americano. Então, nem importa muito dizer o depois:
provavelmente o seu cara não olhou pra trás.
provavelmente os amigos cansaram de esticar o braço.
provavelmente todo mundo esperava uma vitória na maratona e uma música bem legal de fundo.

Mas que ela deu o passo, sou testemunha: deu.

11 de outubro de 2011

Teoria do "onde"

Fora de qualquer cômodo, dentre um hábitos considerado saudável e outro, ela sentou e escreveu assim:
"O reflexo interno de qualquer lugar inédito é vivo, mas, por ser de condição impressiva, já possui um agente. O agente é vivo, mas não tanto quanto o espaço que o rodeia: eis o sublime. Por algum modo natural de equilíbrio, o agente termina revigorado num ambiente familiar. Quem é humano e retorna, racionaliza a saudade do seu velho-eu e se vê ali também nos danos, na falta, na morte, na rachadura que fez ao tentar pôr um quadro na parede. Um sentimento o atinge em todos os lugares do corpo: queria ser menor, como era quando chegou ali; abriria mão das experiências pelo prazer de revivê-las. Era agridoce. A nostalgia que um ambiente causa é a saudade de ser o que se era somada à lástima da morte causada ao lugar."
E sobre as coisas não sabidas disse isso:
"Antes da chegada do agente, já havia manchas em todo lugar. Pela lei do tempo, virá uma nova pessoa que terá a rachadura do quadro como revitalizante e, então, todas as paredes cairão por ação de alguém. E outro alguém, mais tarde e depois de fazê-lo, lastimará ter construído-nas de volta. Também é verdade que dois agentes podem estar presentes, sendo assim, para cada um deles, o outro é parte do onde."

7 de outubro de 2011

O dia em que a razão ficou na gaveta

Comecei gesticulando.
Eu pedi por uma confirmação.
"Por favor, não fale nada!"
Joguei no lixo o velho argumento de ganhar discussões.
"Mas você disse que..."
Eu não disse nada.

Comecei gesticulando.
E as mãos, desimpedidas,
vão para onde querem ir.
Não se condena a vontade:
vão para onde devem ir.
E criam o caminho passado.

Comecei gesticulando.
Cada toque era um trecho da trilha,
cada tombo era um triste tormento.
quando tonta, tatuei tua tara,
caí no esquecimento.
Já que a mente não trabalhara.

Comecei gesticulando.
E, na verdade, comecei assim
porque só a razão percebe os erros
e era um caminho todo errado.
A mão só age sem esperar,
mas outra mão a tocou de volta.

Sem gesto nenhum, ele disse "sorry"
e eu, contrária a mim,
querendo e sem-querer,
deixando de lado as frases de filme,
despida de lembrança e motivo,
mas vestida de gestos, só ri.

4 de outubro de 2011

Criatura

-Venho descobrindo que escrever, pintar, gravar, musicar é um exercício de registro. Ok, eu já sabia, mas eu tinha certeza que era feito para que os outros soubessem o que eu penso, era uma tentativa literária de conseguir aliados em uns e outros sentimentos. E eu prestei atenção na visão e em como ela mudava com o tempo. O tempo, não: os acontecimentos, as memórias e os silêncios. Os silêncios, eu resolvi não mais. Escrevi e dessa vez eu sabia que era pra mim. Contar uma história perdeu a importância: seria a minha e eu sabia. Apresentação de personagem: seria eu e eu sabia.
-Sete horas da manhã. São Paulo, capital. Um escritor levanta de sua cama e vai arrastando os pés para o banheiro. Mexe nos espessos cabelos pretos, que ainda guardavam mechas queimadas de sol do último verão. Lava o rosto, faz xixi, de olhos fechados vai à sala. Não toma café, nunca tomou. Mentira, já tomou, mas não tem como hábito. Tem muitos poucos hábitos, na verdade: os higiênicos, os mais obrigados. Senta-se e escreve, deste texto, o primeiro parágrafo.
Como sempre, está atrasado e não dormiu bem, então bota a roupa de viver e, com o caderno na mão, sai. Nada de inspiração: o escritor vai ver o concreto do mundo, vai entender sobre como as pessoas são, o que é o comunismo, aprende a andar de ônibus, a ouvir música e se desanima, pois é poeta e é egocêntrico (pleonasmo?) e só quer escrever de si.
-Abre a página do blog - "Nova postagem", precisa escrever pela cobrança de todos os lados, precisa botar pra fora. Folheia os cadernos e nenhum texto alia qualidade e jovialidade. Começa com "Descobri que...", mas é muito certeiro e tudo na pra ela ou é na metade ou é compartilhado com mais gente, porque é uma dependente química de gente. Condiciona pessoas a atividades, a lugares, a momentos e sofre de abstinência quando não toma a dose necessária. Prefere "Venho descobrindo...", pouco prepotente, socrático e serve. Vai e começa a se escrever.
-E começa a me escrever. Quem diabos ele é pra se dar ao direito de sair do papel? Ah, mas que poesia bonita e falsa é essa cujos personagens não vivem: estão na minha mente, estão na minha carne, nos outros, no verso - que é muito mais do que tinta em papel. Usa da sua maior arma: as palavras. NÃO! Cale a boca! Você sabe muito de mim!
-Acima de tudo, ela é uma garota. Guarda uma paixão meio impossível, mas não porque é imaginária como as de criança. É impossível porque ele é bonito demais, legal demais, inteligente demais. Ah, ela é uma garota, sim! Só uma garotinha! Quer se dizer super inteligente, não é? Porque só eu acho-a bonita e só vejo graça nela, teve de fugir pro campo intelectual. Todo mundo procura a coisa na qual é melhor, não é?
-O escritor vem cheio de segurança porque não tem nada a perder.
-Ah, a garotinha é inteligente mesmo, eu admito. Não fique brava. E linda ela é, com o sorriso dela e o cabelo meio bagunçadinho. E temos uma coisa em comum: eu escrevo e ela também, criamos assim nosso universo. O código: língua portuguesa. O canal: ela na caderno e eu por ela.
-Você por mim, então defino que, por pudor, mas com um largo sorriso na cara, esse é o último ponto final -> .
-(Ela acha que pode me controlar, mas sou reticente pra sempre.)

23 de setembro de 2011

Sobre a Verdade Absoluta

Todas as certezas fenecem diante da Verdade [sim, aquela cuja existência é duvidada, a Verdade Absoluta e codependente das outras existências]. Mas, no final, quem perde o jogo é ela: a Verdade não sabe se colocar pra nós se não por meio de um par de olhos ou de ouvidos; a Verdade tenta nos invadir, mas sempre chega na razão mastigada, digerida, formulada e transformada na certeza pessoal e cada um tem o poder de dizer 'do que a Verdade me dá, vejo isso.'

18 de setembro de 2011

Concretude

É porque sobram palavras:
Já concretizaram-se na mente
a verdade e a vontade.
Vazia, vai vã a vida,
mas, talvez, olhe só,
pensando bem, quem sabe
não se precise do metal,
da madeira, da mesa.
Nem da pele, do pelo,
do passo, do 'posso?'.
Talvez precise só do pensamento,
do concreto na mente,
da verdade sem vaidade
que vi chegar um dia
e que, de longe, logo notei:
tinha cara de alegria,
tinha até cheiro do amor,
mas era só a inominável vida.

31 de agosto de 2011

A segunda mudança descrita durante a terceira

Conservam-se nítidas como na manhã seguinte, não a racionalização, mas as próprias lembranças da sensação que me tomou naquela noite. A começar pela falta de normalidade do dia que só fez coroar a estranheza da semana inteira. Todos os pertences em caixas e o armário que guardava segredos em todos os cantos, desmontado. Os segredos brutalmente despojados se grudando em mim como última esperança. Fui ao quarto que choramingava uns adesivos na janela e desenhos na parede. O chão tinha ainda seu taco solto com o buraco imundo.
Tomei um banho e o apartamento debochou carinhosamente do nosso grito de liberdade: se fazia necessário. A atmosfera toda guardava, por trás da nostalgia óbvia, um tom de absurdo como se tudo fosse um sonho esquisito. Ironicamente, a sala chamou não pelos móveis, mas pela TV em cima de um caixote cheio de comidas, que se assistia de um colchão, porque acho que as coisas tendem a se parecer com seu princípio quando estão para acabar.
E entendo: o que me faltou na época foi saber que era assim, feliz, porque parecia o começo e, no entanto, triste pelas diferenças. Com um companheiro a menos (e um a mais), rumei para o começo do novo ciclo. Já tendo quarto e cama, deitei do dia de trabalho e adaptação. Mais cedo, pude jurar que viveria de nescafé e com uma roupa incomum que tirei do armário-mala coincidentemente. Me enganei. De qualquer forma, agora já usava pijama e, deitada, olhando pra cima, respirei o ar quente do final de um verão. A janela aberta, ouvi cigarras e uma mariposa enorme pousou calmamente na parede. Entendi, então; por compensação da automaticidade, ganhei uma casa viva.

15 de agosto de 2011

Saudosismo

Uma casa cheia de oportunidades a longo prazo, um prato que é uma tampa de plástico com brownie do Pão de Açúcar, a internet ainda; mas a vontade de fazer tudo ao mesmo tempo: assistir tv com cobertor e pipoca e universal channel, msn pra fingir companhia e refrigerante e meia-luz, ler na cama com o abajur e um copo de leite, saltar pela janela, pular o muro, sair pelo portão afora, cozinhar algo inusitado, nunca fiz pão aqui, e limpar. E limpar.
Tornar seca a pele debaixo do chuveiro quente, agora na luz forte - mas que ironia! que esse banheiro sempre foi escuro. Chamar o pai, me leva no shopping!, na casa da Nani!, me leva pra escola hoje por favor que eu 'tô cansada?, almoçar na casa da vó e voltar discutindo - a noite é quase madrugada pela cor, a barriga vai lotada e não se consegue adiar mais o percurso pela João Dias, mas se quer conversar e conversar.
A verdade é que quatro quilômetros pra cá ou pra lá não muda a distância quase. Muda o bairro, muda a facilidade, mas é tão pertinho; muda a vida, a casa, a rotina, a facilidade, mas é logo ali; muda que tem que esperar elevador e andar até o ponto, muda que tem clube, piscina, que o quarto é menor. Não importa: muda.
Uma saudosista cheia de oportunidades a longo prazo, mas que dispensa todas elas e cimenta a mente. A isso me resumo.

11 de agosto de 2011

Sobre a sorte e afins

Mudou o nome pela numerologia.
No RG, Marina. Pra sua mãe, Marina. Pro seu pai, escolhi o nome com tanto carinho, poxa! No canto do quadro e na parede do quarto, Marinna. O nome pelo qual atende é o mesmo. Na carne, nada há. O cérebro racionalizou em partes: sou Marina até Marinna ser. Nos olhos, ainda mar e a solidão que ene nenhum tira.
Diz que dá sorte, né? Reduzamo-nos a animais humanos. De humano, nome é parte oficial. Reduzamo-nos a analfabetos. Ainda que errada, a língua é parte essencial. Reduzamo-nos àquele humano sozinho que nasceu longe e pensa em fotos. Sociedade humana, a palavra é parte grande.
Marinna sem nome sem nada compra a sorte, que não se alia à carne, e que disse o jornal, a vizinha, a tevê, o professor de arte, a numeróloga - todos sem nome sem nada - e vende ao pai.


PS.: "Eles eram muitos cavalos" pra soltar a escrita.

4 de agosto de 2011

Pagamento pela justiça nata

Cego da dor da morte,
brande a arma o irmão mais próximo.
Não porque lhe traria à vida
ou porque assim quisesse.

Vingava o sangue que, em si, já era vingança
e, indiretamente, vingava um remoto antepassado,
sabendo que a bala que saísse de seu cano
logo perfuraria seu corpo também.

Vagando pela neve branca e luminosa,
viu-o recortado contra o céu albanês
Não foi necessária muita empatia para saber
que o homem era seu inimigo, seu irmão e ele mesmo.

Sem pensar duas vezes, carregou sua espingarda
E, decidido a derramar sangue de um assassino, atirou.
Suas mãos moles derrubaram a arma quente.
E a neve, agora vermelho-aguado, o recebeu.

O inimigo aproximou-se com o barulho
Grato, admirou o sorriso no rosto morto
E, por causa de uma dessas ironias que ocorrem em poemas,
a arma, rebatendo numa pedra, apoiou-se em sua cabeça.

PS.: Abril Despedaçado, mais uma vez.

26 de julho de 2011

Análise I

Achei a teoria básica do meu interesse lendo um desses blogs. Na prática, equiparo pessoas a sabedorias e, tanto com um como com outro, o interesse se aflora ao vê-lo um degrau acima na maior parte das escadas. Ei-las: independência (de mim), avanço intelectual, auto-confiança (para as coisas, a certeza externa de sua existência), aparência física e outras mais que, ao descobrir, farei questão de anotar.
Basicamente, concluo, então, que me apraz ter as coisas que, sendo mais avançadas (maiores, mais bonitas, mais relevantes), estão à minha frente. Nota-se nisso a minha sede humana e comum de alcançar as coisas que ainda não pude tal como a dificuldade em fazê-lo.

12 de julho de 2011

Sobre o aflitivo não-saber

Eu sonhei que você me ligava dizendo que era tudo diferente de como é. Veio logo depois de eu checar minha extensão, não mais quebrada, ligada na parede e, do outro lado, música. Sonhei que você me botava no carro e me levava primeiro pela cidade, depois pelo país, depois pelo mundo e, enfim, por mim. Viajava nas entranhas do meu cérebro e o acendia. Você era aquela transmissãozinha que faltava entre uma conclusão e outra e que terminava sempre por me fazer notar que o mundo é todo uma coisa só.
E aí eu caí em mim e percebi que estava acordada. E ainda sonhando.

11 de julho de 2011

Crenças

São as crenças selecionadas: um pouco acredito de tu, um pouco de tu é mentira (ah, e essa mentira tem tantas, mas TANTAS razões que se eu citar egoísmo e auto-proteção seria vago), que me cria a péssima sensação de que o mundo é profundo como uma folha de papel. Esta folha, de tanta idade quanto minha mente, tem marcada a lápis todas as minhas verdades. Algumas tuas, algumas de outros, algumas conclusivas. As pessoas são só fontes.

É tão feio assim?
Alguém me diz que não.
Alguém me diz que não, por favor.
Alguém me prove! Por favor!

20 de junho de 2011

Sobre estar em casa

Hoje eu vim de frente pro Sol
e ele sumia no horizonte.
A sombra no inverno é fria
e eu tinha que correr contra a rotação terrestre.

Pois foi o branco do Sol
e foi o branco do céu
que inundaram meus olhos
de todas as cores que o compõem.

Na cegueira, surgiram fortes
olfato, tato, paladar e audição.
Veio ainda mais um sentido
o mais útil: a memória.

É que meus pés desviavam
dos buracos do caminho todo
Minhas mãos sozinhas me rodavam
em volta de cada poste, dançando

Meu corpo cego sabia do atraso
que, calculado, me dava seis minutos
E meu cérebro criou uns versos livres
racionalizando o semanal e sublime.

8 de junho de 2011

Sobre a velha sala clichê para sentimentos inéditos

Vê?
Eu já até escrevo como em velhas baladas norte-americanas.
Os versos vão assim se amontoando sem ordem à qual se dê sentido.
E ao meio uns cigarros em cinzas. Os pés calçados de couro.
Pelo ar vem voando um jazz, empurrando a matéria, que sempre volta, como se insistisse em mudar de propósito. E não muda.
É o mesmo cenário e, nele, cadeiras de velha madeira, paredes de amarelo, o cigarro, eu estou lá, mas ausente. É, de fato, se me procurar, jogando os olhos a todos os lados, não estarei. Nem no espaço, nem no tempo.
Mas existo o infinito.
Enfim, é tudo somente mentira: o clichê de um filme antigo, que nem mesmo cores costumava ter. Ah, as paredes amarelas da nicotina e do tempo não mais, mas ainda o cigarro cinza.
Sou, se os autores nem mesmo me cogitaram?
Sou, se eu nunca vivi tão falsa e vulgarizada cena, mas se ainda comigo carrego
a solidão, o violão, a madeira, a cadeira, as velas, as amarelas, o jazz, os pés
que constituem esse sentimento que tem nome tanto quanto a desocupação repentina e a saudade do que não mais se gosta, e que tenho a liberdade, dada e recebida por mim, para sentir?

4 de junho de 2011

(In)existência

O mundo não é feito pra ser, creio, e, mesmo assim, todas as suas concretizações parecem perfeitas aos meus olhos humanos, que só sabem ver sombras. A eternidade, então, cabe só a Platão?, havendo, portanto, infindas existências a mais do que nessa foto (se seguirmos a ideia de que quantidades mínimas de tempo são desprezíveis) que presenciamos. Me parece, pois, que as coisas que me vêm à mente, e só a ela, trazem sempre falhas de acontecimento e talvez seja isso que faz permear a realidade como é. Mas talvez ainda a única das implicações seja a própria não-existência. É esse impasse de causa e consequência que não consigo resolver, senão por meios dedutivos, mas penso agora: não é tudo isso, ainda(?), uma enorme dedução?

23 de maio de 2011

Ao meio

O sol derrete o asfalto embaixo e seca o céu em cima. Mãos que passeiam pela testa úmida, pelo buço suado e ainda assim alcançam os sorrisos, de tão toscamente palpáveis que são. Vão Max e Zé com o mesmo passo, ainda que diferentemente subdividido. José leva a maior expressão de satisfação e Max leva a língua de fora, ofegante. Zé diz "que calor!" somente como resposta imediata ao incômodo que é a temperatura, não que seja solução, mundo mundo vasto mundo, pois pra esse Zé a festa ainda não acabou. E agora? Max, incômodo-estímulo, pausa para xixi e segue. Pode-se notar nos seis membros que os carregam uma constância de movimentos: retraído, relaxado, retraído, relaxado. Pode-se ouvir o inflar dos dois pulmões, as unhas de quatro patinhas no chão e a endorfina sendo liberada e jogada na correnteza que são as veias. Vê-se uma dupla mesmo alegre andando. Ele ganhará biscoitos quando voltar. Porque passeio é sinônimo de biscoito e Max gosta de biscoito, pode-se ver no seu rabinho que abana.
Estacionam uns carros e o movimento hoje é grande. "Parece que vai ter algum Corinthians e Palmeiras ou algo assim." diz a atendente que não entende nada de futebol. Estão comprando cervejas e foi aqui o lugar escolhido "porque estava no caminho mesmo." Os torcedores de camisas verdes se vão e, em segundos, sobra o barulho das bombas de gasolina, o frio do ar condicionado mal-regulado, a estupidez das revistas de fofoca e eles dois: a atendente que agora resmunga para a tevê e o poeta. Este segura um livro e de olhos baixos, bem próximo à gradezinha de onde tirou seu exemplar, aproveita uma versão de bolso pela qual nunca pagou e que achou ali em meio a livros da Zibia Gasparetto, outros de auto-ajuda e uma pseudo-comédia feminista. A verdade é que o poeta nem liga para o teor dos vizinhos de seu livro; volta sempre e pega sempre o mesmo livro, sem conseguir entendê-lo por completo. Lê as primeiras páginas, volta à capa, relê a sinopse. Em alguns determinados dias chega à última frase do livro que não esclarece nada; pelo contrário: confunde mais. O poeta é um homem compreensivo, já leu de tudo e sabe um pouco até de mecânica, dos manuais de instrução, e de enfermagem, das bulas de remédio.
Max e Zé chegam na casa bonita no bairro relativamente bom em que moram. No parapeito, Pelargonium hortorums muito rosas foram plantados pela esposa de José, que passa o dia assobiando para as flores, para o feijão, para a cândida e para si mesma. Seus ouvidos, ocupados por essa atividade, não sabem de outra coisa a não ser aquele silvo agudo que rebate nas paredes brancas e volta, assim, tão alegre quanto ela. Voltemos a nossos personagens principais: Max abana o rabo mais forte agora, como se fosse possível, e José lava as mãos enquanto sonda um bolo ainda quente que sua esposa preparou. Abocanha-o. O corpo é mesmo inteligente: lá se vai açúcar goela abaixo e a sensação de prazer que o toma é resposta para aquela energia que, dentro de algumas horas, se infiltrará nas células adiposas dele. Ele não sabe disso. Come e se delicia e não vê mal em mais um pedaço. E mais um. E mais um sem parar.
A atendente não mais se aborrece: já acostumou-se com o poeta que esbraveja ao reler e reler as mesmas frases. Devo dizer que ele, há certo tempo, aprendeu a odiar aquele cujo nome vem sempre estampado nos livros que ele procura: Vladimir Maiakovski. O problema do poeta, a quem dou aqui nome que espero que o liberte (Carlos, que tal?), é que pode entender as frases do escritor literalmente, pode até captar seu sentido conotativo, mas só vê ali mentiras. A indignação vem de, sendo o homem informado que é, ouvir tanto bem-falar do tal Maiakovski e não ver em seus escritos toda essa genialidade. Ver somente mentiras. Poeta-leitor é o que é. E é isso que o amarra àquela leitura: a sede de entendê-la. Ele sabe que ali, em algum lugar, deve haver alguma verdade ou algo que, finalmente, dê sentido ao livro.
José sai da cozinha lambendo os dedos e se joga no sofá, pegando o controle e aceitando o canal no qual a tv já estava. Ele ouve alguma coisa interessante sobre culinária, mas o assunto muda para outro: aquela moça da novela que traiu o namorado com o cunhado. Logo que ele se interessa, vem outro que já o fez esquecer a receita: tragédia no Rio de Janeiro, uma breve história comovente que faz sua esposa parar no corredor, com os olhos marejados, segurando o pano de prato sem notar. "Que tristeza! Imagine perder tudo, amor." e ele sente uma vontade inédita de dar moradia à criança que chora na tela. A tv começa repentinamente a falar sobre política e as lágrimas se vão, seguidas pela negação que a cabeça dela expressa. José não pode acreditar no que acaba de presenciar: sua esposa desligou-se da reportagem como um se houvesse um botão para tal. E então, assustado, ele clama pela tristeza dela e recebe somente olhares de estranhamento.
Maiakovski continua dizendo suas intensidades. Friso novamente a inteligência de nosso Carlos. Então como a vida poderia ser aquilo? Nosso poeta nunca precisou de alguém a ponto de ir à sua janela implorar. Mas é gente: Carlos já teve mulheres, já fez sexo muitas vezes na vida, já amou suas namoradas, já odiou suas namoradas, já sentiu falta e já se livrou delas. Aos 37 anos não quer se matar (ah, Vladimir...). Agora vive sozinho numa loja de conveniência que o entende tanto quanto todas as que se deitaram com ele. E então Maiakovski repete as coisas que nunca existiram, cria imagens, se joga de um sentimento a outro e faz o poeta notar, finalmente, coisas maiores que a métrica: que as coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão. Platônico, ele pensa, mas resolve desclassificar seu pensamento.
José nunca se foi e Carlos nunca foi seus amores. Em José há nostalgia, em Carlos, insegurança. Que perda de tempo! Que perda de tempo! Físico e mental. Externo e interno. O feliz e o triste? Nossos dois dão um passo um pra mais perto do outro e no meio há a verdade: a coroação de si mesmo.

PS.: Maiakovski, Drummond e Baleiro, com uma pitada de Camelo.

21 de maio de 2011

Da realeza

Que tragam as frutas de melhor colheita,
aos felás darei os caroços.
E leiam-me as mais belas canções
e os felás que criem seus carnavais.
Tragam-me a sabedoria e os vinhos mais antigos,
aos felás o prazer carnal sem refinaria.
Que tenhamos sempre a fartura
e os felás hão de nos fornecê-la.
Para tudo, aos felás o que der,
aos nossos fellas, o que quiserem.

19 de maio de 2011

Vergueiro

Estabeleceu-se tempo de escassez criativa de mim, devida ao meu atual período de absorção: tenho lido, ouvido muitas coisas, conversado muito e visto muitas coisas novas, bonitas, feias, inclassificáveis, mas, acima de tudo, reais. Enquanto a fase não passa e as coisas não voltam àquele mesmo jeito de sempre, fico aqui aquecendo e vendo crescer os pensamentos e estimulando-os muito. Com a finalidade de não deixar o blog a criar teias de aranha e a ser ausente nos vossos históricos e com a finalidade de me distrair um pouco venho contar-vos uma história pela qual esse blog e essa pessoa já passaram.
A partir do meio do ano passado até o final dele, eu estudei na rua vergueiro, longe da minha casa, mas bem próximo do lugar que viria a ser meu. O que acontece é que na mesma rua situa-se o Centro Cultural de São Paulo, aonde eu ia quando, no intervalo ao meio-dia entre uma escola e outra, havia um momento só pra mim. Por vezes, eu almoçava rápido só para correr pra lá. Acontece que me acostumei com sentar naquele banco e ver as pessoas pra lá e pra cá, passar os olhos pela programação de shows, ver as aulas de dança que aconteciam no auditório, comer os muffins deliciosos do restaurante e escrever. Sim, muitos dos textos aqui postados foram feitos sob aquele sol, observando aquelas pessoas e, mais, me deleitando com aquele silêncio que não pesa. A biblioteca do centro cultural também é muito legal. Fica no subsolo e tem uma gibiteca gigantesca que, na verdade, nunca me chamou tanto a atenção quanto as mesinhas nas quais eu me sentava pra fazer todos os tipos de lições, trabalhos, textos e descobertas. E o mais legal daquele lugar era que ele era todo meu, eu ficava sozinha lá, às vezes parada, quietinha, em silêncio e o tempo também parava, mas às vezes preocupada, sob chuva, sob sol e enrolada em casacos pesados. O lugar era meu.
Tinha mais uma: sempre gostei da tarde para descansar. Para mim, manhãs são agitadas e vivas, noites são pensativas e úteis, mas as tardes são feitas para o descanso e a restauração.
De qualquer forma, a combinação dos fatores me fez gostar do lugar e voltar lá toda vez. A inspiração que fluia devia ser resultado da liberdade mental que eu me concedia naqueles momentos tão brandos. Decidi agradecer o Centro e escrevi tantos poemas quanto foi possível, mas não queria guardá-los pra mim e escrevi-os nas paredes. Literalmente. Começava por um título, discorria sobre o assunto que fosse - e foram diversos - e terminava com o link deste mesmo blog que vós ledes. A quantidade de poemas escritos foi a mesma de poemas apagados, mas eu nem me importava: retornava e vinha com novos versos. Hoje acho tudo meio estranho e feio, mas o impulso era sempre mais forte e eu não podia segurar a mão que avançava com sua espada colorida em direção às portas dos banheiros, paredes, espelhos e cantos da biblioteca.
Eis que um de meus pensamentos trouxe-me o mais lindo dos resultados. Num texto qualquer aqui postado, recebo o seguinte comentário: "te encontrei no banheiro do centro cultural vergueiro" Só. Sem pontuação. Sem resposta quando pedi por uma. Somente essa mensagem de alguém que leu e teve a ação de não simplesmente clicar num link, mas se interessar, copiá-lo e vir procurar por ele. E esse gesto bobo, que aqui aumentei um milhão de vezes, me fez e me faz continuar escrevendo.

5 de maio de 2011

Ode à exatidão nas minhas humanidades(ou A tentativa de tal assassinato)

O mundo pede um ultimato
E eu mato que é pra não mais viver
O mundo me quer morto, me quer farto
Porque senão eu surto e eu posso e eu passo.

O mundo me pede um fato
Um dado matemático pra jamais duvidar
O mundo me quer pouco e age
E é ultraje pensar e eu penso e eu penso

E então há o indiscutível sim.
E, portanto, o rígido não.

E cadê o talvez que não é nem verdade?
O quem sabe que quer e muda de ideia?
Cadê os quereres, os dizeres, os cadê-res?
O pode ser de quem se subverte o sentido?
Cadê as perguntas ao fim do poema que tem como finalidade me responder?

(O são pelo simples ponto de interrogação?)

1 de maio de 2011

Como em todas as madrugadas

A noite cairia, mas como se sempre se fizesse presente, já que seguiria uma tarde cinza. Se instalaria tal escuridão daquelas que nem a Lua se vê e que não seria digna de contemplação. E então respirariam fugindo à densa - quiçá líquida - forma do ar algumas luzes: faróis de carros e o semáforo. A TV estaria quebrada e tu não terias paciência para teclar. Fome não haveria. Somente a vontade do corpo; aquele desejo incessante de correr, suar e de ter o coração rufando no peito. Tampouco a sede incomodava: na realidade, pedia-se a sede, enquanto último vestígio de instinto. Então, tu colocarias teu batom mais vermelho e deixarias o cabelo bem armado, como tu sempre gostaste. As unhas tu cortarias. Tu roerias bem rente à carne e faria derramar rubro sangue e provar-te-ias viva. Viria então o ciclo, na mesma madrugada. As mesmas luzes refletiriam teu rosto branco, te fazendo notar o quanto tu odeias aquele batom, que tanto te fazia remeter à sexualidade. Tu odiavas ter que pô-lo a ninguém. Tu pentearias os mesmos cabelos da mesma maneira de sempre, pois a necessidade imperaria sobre a beleza. A mesma música rolaria no ar. As madrugadas paulistanas teriam o mesmo amarelo. E ainda a mesma Lua se esconderia na mesma nuvem. Mas de alguma forma tu serias como nunca foi. O batom deixaria vestígios no lado interno de teus lábios e tu notarias que aquele som que se ouvia seria assim escutado pelo resto de teus tímpanos a menos que tu resolvestes soar.

20 de abril de 2011

Sobre os amores e as paixões

Aos amores brandos,
que sejam tardes de domingo
azuis ou mesmo cinzas,
tépidas ou mesmo frias,
mas, acima de tudo, calmas.
Que sejam bons e afetuosos,
e satisfatórios como a cama
d'um homem vivo de muitas batalhas.
E que, apesar de - ainda só
com o pesar de um abandono
(que lhes caiba a compreensão
e uma pitada de poesia até) -
vivam.
Apesar de meias e abraços
e meios-abraços
Apesar da falta de mergulho.
Da constante presença de ar.
Apesar de coadjuvantes,
que sejam tão inevitáveis
quanto essenciais.
E, por fim, que se esqueçam dos outros,
sejam eficientes e amigáveis
e tão insubstituíveis quanto prazerosos.
Para que venham as paixões.

Ah, e as paixões hão de ser fogo
As paixões vão rasgar e sangrar
E o abandono te arrancará órgãos
As paixões vão ser lembradas
com todos os seus detalhes
E vão rasgar
E vão sangrar de novo
Mas as paixões serão como flechas de endorfina
perfurando seu corpo.
As paixões saberão ser brandas,
quando necessário
porque serão imperdíveis
e não sabem parar de arder.
E a paixão fará o homem
aquele vivo de de muitas batalhas
se erguer e deixar sua cama
pelo prazer de ver doer o embate.
E que, por causa de - ainda só
com a indignação de um abandono
(que lhes caiba a combustão
e mares de poesia e prosa) -
vivam.

Cadernos

Loto fins de caderno
Com o que almeja ser eterno
palavras que eu quis
para frases que eu fiz

Há no fim uma sujeira
Espalhada de tal maneira
Que torna a podridão
Só uma forma de expressão

Enquanto que no começo
As palavras têm apreço
pela sua moradia
e dispensam poesia

Porque versos só são versos
Se estiverem imersos
Em tão grande liberdade
Que nos dê autoridade

Pra dizer não ao professor
E gritar sim à própria dor
E poetar de coração
No meio da redação

9 de abril de 2011

Trecho de "Sincronia"

[...]

-Você não é uma qualquer.
-Sou quando ando na rua e os outros me cruzam nas calçadas. [...] Quando pego o ônibus cheio ou leio spams. Sou uma qualquer.
-Impossível ser qualquer pra si mesmo! Para você faria toda a diferença estar a rua ou em casa, escolher ir a pé ou excluir seus e-mails sem ler. Para si é impossível não importar uma vez que você é o observador. Ou mesmo para os outros: experimente sorrir para alguém qualquer na rua e verá como a pessoa toma forma ao te adentrar.
-Quem está aí? Quem diz isso?
-Eu digo.
-Fico feliz.
-E você? Quem fala aí?
-Eu me adentro e me invado. Quem fala sou eu e eu sou quem fala.
-Isso é mais do que se você me sorrisse na rua.

6 de abril de 2011

Toque dele

Tua esquerda é de não caber palavras
Mesmo os maiores professores tu destruiria
Se lhes faltasse o tato
Se lhes faltasse o tato

Tu desenhas coisas que eu não ousaria calcular
E pinta fotos com as palavras
Que são tão doces
Que são tão doces

Vejo imagens que tu vês, que tu ditas
E chego a sentir aquilo que deveras sentes
Que mente, mas sente
Que mente, mas sente

Sem sentido, mas você sorri desse jeito
Eu que já perdi a hora e o lugar
Eu só aceito
Eu só aceito

PS.: Para o "Toque Dela" em geral. :)

30 de março de 2011

Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres

, e surge aqui um capítulo que dá sentido ao resto - como todos os outros fazem, surge um capítulo que responde a questões dos anteriores - como todos os outros fazem, e que é essencial para a continuidade da história - como todos os outros são. Porque, no fim, a vida significa o seguinte:

25 de março de 2011

There's no fight against life

Você pode lutar pelos seus amores
Pode combater seus inimigos
E esfaquear seus medos
There's no fight against life

Você pode derreter sua mente
Pode gritar contra o seu corpo
E derrubar as paredes da sua sala
There's no fight against life

Você pode até socar suas vontades
Pode negar seu exército
E sangrar as feridas alheias
There's no fight against life

E você pode esfarelar seu si
Pode devolver sua energia
It's just a runaway
There's no fight against life

Life is a giant fight by itself.

17 de março de 2011

Lispector

Eu tocava guitarra quando a campainha tocou intermitente em seus intervalos curtos. Taquei a palheta em algum lugar e corri, pois tenho aflição da aflição daqueles que não encontram o que procuram. Tal qual o telefone quando toca sem ser aliviado, a campainha aumenta seu desespero a cada vez mais que é apertada. Chutando o cachorro de lado, abri a porta correndo e um carteiro jazia com sua roupa azul-amarela e o sorriso azul-céu que faz com que toda teoria da campainha desesperada vire somente uma loucura minha. Estava o tal carteiro na paz incomum de quem não tem pressa - e quem por aqui não tem pressa? Fui simpática como não costumo ser. Assinei um ou dois papeis e olhei para os dois pacotes que endereçavam-se a mim. O primeiro eu já sabia o que era: meu irmão que me devolvia um documento meu levado sem querer. O segundo me surpreendeu.
Havia combinado com uma amiga de Viçosa, no interior de Minas, que ela me mandaria um livro de Clarice Lispector que eu lhe disse que queria ler. Me esqueci de dizer que tenho lido religiosamente "A máquina do Mundo", que é a coletânea de crônicas escritas por Clarice no Jornal do Brasil entre os anos 60 e 70, como se o lamentável dia 9 de dezembro de 1977 (que se não fosse esse, seria outro tão lamentável quanto) nunca tivesse existido. Sim, leio-o como se falasse com ela, como se ela me ouvisse e, pior, como se ela sussurrasse cada uma de suas percepções pra mim. Bom, imaginei que fosse o livro que chegava no pacote estampado com uma paisagem. E o era.
Ainda não abri, exceto pra pegar uma carta que vinha junto. Carta esta que, escrita à mão, me fez pensar como a tinta que viaja quilômetros é muito mais intensa do que qualquer coisa que venha virtualmente, simplesmente por já ter estado nas mãos de pessoa tão distante. A palheta não consigo mais achar, mas não faz mal porque vou fazer um café e ficar por aqui namorando essa obra até que Clarice se desocupe e resolva vir sussurrar-me ao pé do ouvido de novo.
E aqui ficam um abraço fraterno pra Nica de Minas, um sorriso ao simpático carteiro e um clamor desesperado a Clarice.

13 de março de 2011

Daqui pra frente

E eu deitei. Um travesseiro pra fazer doer menos a mão e a coluna numa posição absolutamente desagradável. E eu deitei e ouvi todo meu passado que me perguntava "sabe?" ao fim de cada frase. Ah, e eu sabia. Só aceitava com a cabeça e ela falava e ela falava. E então eu falei meu futuro. Eu menti meu futuro. Eu nem mesmo sabia e repeti "e se? e se? e se?" A coluna doia mais. O escuro desbotou as cores. Se eu fosse escolher uma hora pra morrer não seria aquela. Havia tanto a ser dito e a tanto a ouvir. E dissemos e ouvimos. Só morreram partes, que desgastaram e voaram como pó. O medo tornou-se visível. Risível. A coluna me obrigou a trocar de posição. E eu concluí - e nós concluímos: eram necessários equilíbrio, paciência e coragem.

2 de março de 2011

Salão de Dança

Devo admitir que condeno alguns tipos de música por serem simplesmente 'dançantes' e que condeno ainda mais algumas danças, principalmente quando são coreografadas e quando deve-se andar estritamente não-sei-quantos passos pra cá e pra lá. Vejo porém uma beleza forte e inteligente em duas pessoas que bailam deixando-se levar pela música e pelo outro. Sinto uma cumplicidade que parece amarrar os dois corpos que podem soltar-se e avoar-se e ainda assim voltam a seu par como fosse casa. Constato tudo isso vendo um grupo de pessoas de todas as idades em algum tipo esquisito de aula livre de dança. Esquisito porque acho que este tipo de coisa não se aprende. De qualquer forma vejo daqui de cima velhinhas que perderam sua confiança e só cambaleiam bobas seguindo o professor. Crianças que correm passos ritmados - as mais entregues!
A negra gordinha é chamada pra dançar com o professor. Ele, entre gracejos, elogia seu borogodó. O resto da turma ri lisonjeada como se ele elogiasse, assim, o borogodó de cada um deles. A gordinha se empolga. Devo adicionar que ela dança bem. Bem como quase ninguém ali naquele lugar, nem mesmo o professor que, sabido de todos os passos do mundo, ainda não conhece seu próprio borogodó. As duas criaturas porém que mais me fazem saltar os olhos não estão no centro das atenções ou têm seu borogodó elogiado. Ambas estão em seus próprios mundos e entenderam, enfim, o que é dançar.
A primeira: um casal que parece estar ali somente pra aproveitar da música que estoura nas caixas de som. Dança com propriedade tanto os passos - que não odeio mais com tanto vigor - como a alma. Ele a leva e o corpo dela vai, mas não sem relutância: de vez em quando se nega a ir pra algum lugar e recebe de volta um sorriso e a concordância dele. Ela reluta muito. De certo, não o quer. Mas por que ainda dança? O engraçado é que, apesar das fortes negações dela, a dança flui naturalmente, sem empaques e de forma sensual e lotada de cumplicidade.
A segunda é uma moça que deve ter seus quinze anos e que perceptivelmente tem síndrome de down. Esta dança olhando pros seus próprios pés - isso quando não fecha os olhos, e balançando os braços da maneira que se sente confortável. O mais incrível é que no salão pouco se encontra gente que siga agindo sem errar nem mesmo um compasso. Ela não erra. Arruma o cabelo em dois tempos e esbarra num casal em um que não sobra pois logo ela preenche mais um se recompondo do tranco. E assim vai a menina. Perfeitamente compassada. E se a música parasse a menina continuaria assim a viver. Continuaria preenchendo a vida com mínimas, semínimas, colcheias e até mesmo pausas de ações.

19 de fevereiro de 2011

Blog

Penso o tempo todo em criar um blog pra contar das cotidianeidades dos meus dias, pra contar a cara de nãoseiquem que eu vi hoje ou a música nova que eu ouvi ontem, mas, então, eu penso que aquele blog seria reservado às verdades da minha vida, aos fatos, aos acontecimentos, o que acabaria resumindo este às mentiras (e eu teria que aceitá-lo). Por mais que todas as palavras aqui ditas sejam inventadas, devo dizer que há, essencialmente, somente verdades aqui, pois escrevo o que se aplica nas situações por certas visões. Depois de concluir isso, concluo, toda vez, que se eu viesse aqui lhes dizer meu cardápio do dia ou que horas fui dormir perderia-se todo o encanto de notar focos e coisas que me chamam mais a atenção e a vida seria homogênea demais. Então decidi ligar aquela teclinha 'foda-se', ignorar a minha vontade egoísta de querer compartilhar a vida a todo momento e de ter essa obsessão pela poesia que não me deixa andar sem achar o passo bonito.

A propósito, só tomei café hoje.
Foda-se.

18 de fevereiro de 2011

Formação

Liberdade quase plena. A válvula de escape, o sempre, o tudo, a base. Abraços desprogramados, a volta, a casa. A casa. Caminhar por ela num banho de afeto cujo vapor perdura. A lembrança. E toda vez que o pulmão e as pernas já velhos e fatigados, já certos e mastigados e devorados, perderem para a estrada, larga-se; cai; embaixo colos, choros, broncas. Opor-se àquela sociedade tão pneumática e limpa e devoradora. A sujeira, a paixão, o sangue e o medo. A casa.
E quando descansados e obesos, quando curiosos e instigados, andar. E ao andar, deixar a deglutição cujo alimento foi você. Devorado. Mas não, agora só andar. Andar, ver, tocar, saber, conhecer. As pedras, as paredes, as plantas e as vidas. O vento passar assobiando entre os vãos de seu corpo e junto dele levar o vapor, o cheiro e o pó. E tropeçar também. E ferir-se e correr. Mundo vasto mundo, deixe-se descobrir. Prostitua seus recursos brutalmente. E ferir.
Por fim, a fuga. Não a fuga do mundo, que seria absolutamente vã depois de ferido e sábio. Não a fuga de casa, que seria absolutamente estúpida depois de amado e alimentado. Por fim, a fuga de si. Momento de tirar aqueles restos grudados cuja proveniência nem se sabe. O vento deixou. O banho deixou. E você arranca vorazmente com as mãos, jogando longe. Pensar, gritar. Ler e ouvir e pensar. E ver! O mais bonito, o mais bruto e o mais pessoal dos lugares.
Em suma, três situações fundamentais. A formação diária do ser. Em suma, três razões pra não deixar que ninguém entre em mim. São três modos de compartimentar a vida. Três motivos. Somente três medos. As três coisas mais racionais que se tem. E são os três maiores obstáculos.

13 de fevereiro de 2011

O poeta

Veste-se com a mais grandiosa farda da soberania, os olhos sempre abaixo e o nariz erguido, você reserva uma parte da alma aos outros e entregando-a finge ofertar o todo. O fato, porém, é que volta a ser um bebê - e não de olhos enormes, mas um que o feche-os a chorar suplicando por algo - quando fala de seus pensamentos. É o que acontece toda vez que tenta ser superior a eles. Diminui-os. E todo pintor há de caber em sua pintura. Diminui-se. Um bebê que chora de olhos fechados. Suplica, achando-se correto, pois que pais - malvados! tiranos! - são esses que lhe negam o que você quer? Você suplica. Suplica aceitação. E pensa em como são geniais seus pensamentos. Só um bebê.
"Pra que tanta perna, meu deus, pergunta meu coração/Porém meus olhos/não perguntam nada." diz Drummond. Entende agora como ele cabe? Entende como não sabe? Percebe que os textos só são verdade por serem um não-saber infindo? Por isso é que todos se aplicam. Percebe? Escreva. Escreva agora o que sente e o que não sente. Escreva a verdade. Escreva sobre o que sabe e sobre o que não sabe. Escreva pois é o que pode a poesia sobre a ciência. Escreva! Escreva mais do que você e então se tornará mais. Então, crescerá, percebe? Crescerá pra ser um homem, bebê - um homem! Um homem livre de verdade.

9 de fevereiro de 2011

Cadê você?

Cheiro ok. Cor cinza. Gente-personagem.
Olhei pros lados imitando meus pais. Foi? Andei em linha reta fingindo uma rota. Sentei no lugar errado e a inércia me mandou aceitá-lo. Olhei pros lados atuando. Cocei o nariz atuando. Fingi fazer uma ligação. Ninguém atendeu. Fingi olhar as horas, mas não passavam. Atuei um caminhar até o banheiro. Fiquei um tempo na coxia e molhei as mãos ao sair. Eu não te vi e não percebi. Olhei pros lados imitando meu próprio gesto. Eu vi as pessoas erradas.
Medo. Insegurança. Sono.
Cadê você? Chegue logo, pois essas pessoas me enojam. Estão virando gente e eu preferia os personagens. Olhe o cabelo cor-de-fogo dela! Olhe aquela alma desperdiçada. Vejo uns sorrisos aqui em volta. Rimos todos, mas porquê? Escondendo-se na multidão fica mais fácil. Talvez se eu ficar quietinha e aqui e só esperar por você.
Curiosidade. Alívio. Imagem.
De onde você trouxe esse sorriso mona-lisa, moça? E esse cabelo anos 60, de onde? De onde vem essa concentração? Essa calma, de onde vem? Vêm todos de lá... vê, lá longe? Meu sorriso escancarado... meu cabelo bagunçado... minhas manias, meus trejeitos, minhas músicas, minhas roupas... cadê você?
Luz. Base. Contato.
Então, aí está! Venha pra cá, sim? Chegue mais perto! Quem é que é você? Você é isso que vejo ou você atua como eu atuei por todo esse tempo? Vê que tiro a máscara? Cadê você? Eu posso ver mais fundo... As pessoas reais são feias, pelo menos, mais feias que o personagem que atribuo a elas. Por que você é tão bonita? Será você mesma? Cadê você? Eu preciso dessa coisinha que você tem aí dentro e que me define! Vamos dividir?

22 de janeiro de 2011

Nossa experiência

Foram passos pra trás, eu me lembro,
dei para longe do ser que mais temo
para me salvar a existência e a sanidade
um pedaço de carne, um sentimento confuso.

Atuei você, atuei eu mesma
E nessa bagunça de papeis, criei um 'nós'
Você nem sabia, e era a diferença que bastava
entre eu dizer e você dizer.

No fundo, eu não sabia também
E nada daquilo passou de um experimento
Mais comigo do que contigo
e nós já não era válido, nunca fora.

16 de janeiro de 2011

Humano

Novamente com um ódio descabido cuja razão é desconhecida escrevo - e clamo como se em escala notoriamente grande fosse - sobre aqueles que levam consigo minha admiração, por vezes sem sequer saber desse efeito que parte de mim e que, assim como surge, atinge tão somente a mim.
Minha apatia não permite que seja interessante - ah, mas seria! - saber como podem certos olhos não brilharem à visão longínqua de fogos disparados no entre de um ano e outro - por mais amistosos que os dois possam ser. Também esses dois olhos não focam-se na mais dura ou na mais bela das inertes paisagens, se ambas puderem ser previstas e nem a boca que lhes cabe pede por mais amor do que pode ser escrito.
Ainda assim esses olhos mortos, essa boca fosca, essa alma profana vêm e cantam e falam e sentem o que de outro corpo não se veria. Porque esse corpo desvenda gestos. Esse corpo ouve sofrimentos tão longínquos quanto - mas muito mais interessantes do que - aqueles fogos artificiais que sobem barulhando falsos choros. Essa boca beija e morde e fala com almas muito mais profundas do que seriam quaisquer paisagens gigantescas. Essas mãos tocam rostos e acalmam, batem e acariciam. E a mente que se diz apática, na verdade doi-se de paixão e anseia engolir o que vê quando encontra outra como si. Humana. Viva.

14 de janeiro de 2011

Levo

Eu dizia a ela sempre que me desse objetivo, porque viver sem cortar uma folha selvagem sequer dessa gigantesca trilha, viver sem pular nem sequer um muro é como ser obsoleto. Eu dizia, em contraponto, que não há tantos muros assim e que o empecilho deve ser estatisticamente gigantesco para que eu possa sequer alcançar tal nível que eu estimava. Eu brigava com ela pela sua falta de sentido e eu vivia cada dia com um alucinógeno diferente, caindo por semanas em realidades radicalmente diferentes e - no entanto - que me tinham como ponto comum. Eu temi que todas as minhas combinações verbais já tivessem sido escritas, já tivessem sido faladas e pensadas. Eu julguei o dadaísmo pelo simples motivo do acaso tornar isso mais real. Ela me respondeu como enigma que o tédio é como um brejo que afunda, que a burrice é latifúndio e que os valores nos impedem de nós mesmos. Enlaçando as entrelinhas dessas charadas da vida eu descobri que escrevo pra mim, escrevo pro meu mundo, escrevo pra entender, pra exercitar, pra mexer. Não há mais a pretensão de mudança externa e se as palavras não forem minhas que se tornem minhas me servindo.

6 de janeiro de 2011

O primeiro passo

Perderam-se tantas ideias nesse ínfimo espaço de tempo que usei para crescer... Seus textos foram jogados no lixo por você mesmo ao dispensar o passado. As frases que você abandonava, mas que eu guardava como filhas minhas tornaram-se falácia, e você virou nada mais do que um homem inteiro (mas não tão inteiro como eu pensava ser) que fez participações imensas no meu passado. Você é o mesmo: ainda foge quando eu te olho seriamente, ainda finger saber mais do que sabe e ainda sabe mais do que acho que você sabe. Não é o estranho, eu sou.
Aquele nosso futuro não existe mais, nem sequer como passado. Foi-se. Arranjei outro pra ganhar meus sorrisos. Você tem a mesma de sempre pros seus. A vida ccontinua e o que a gente julgava ser de suma importância de repente não mais nos tira suspiros. Só saudade talvez... De tudo, daquele tempo. A maioria dos meus textos não são mais seus. Os primeiros sempre serão. O mundo dá voltas e a vida muda muito.

Cenário

Cenário como se fosse praia.

A Mallu tocando no rádio insiste em me dizer que isso tudo é amor,
mas Sualk não é amor. Não somos eu e você. Nem sequer existe um nós para nós.
Não há nada além dessa minha existência sofrida.
Ela fala comigo, não?

I hate being so far.
Eu acho - e estou a ponto de ter certeza - que você não existe. Melhor crer nisso. De agora em diante, é realidade e só!. Me prometo.
Vou deixar a poesia de lado pra ser um ser humano feliz.

Não, não vou. Não posso me imaginar sorrindo agora.

Nem posso imaginar porque essa tinta insiste em ser duas ao mesmo tempo. Fica tão feia assim. Mas é.

É, dorme logo antes que você morra...

5 de janeiro de 2011

Yoñlu

Assustadoramente belo, seu plano. Você montou tudo perfeitamente, não foi? Querer aquela menina, um churrasco entre amigos, angústia adolescente. Comprou carne que não seria cozida, fez com que tudo parecesse real. Não foi? Se fez parecer normal. Ah, e você não o era! E você deixou tudo preparado, o CD gravado; seu grito de liberdade em cima da mesa como se fosse uma coincidência infeliz você não poder presenciar o feedback da plateia. E foi pra ela que você fez tudo! Sua plateia ficou na sua mão. Sua plateia chorou por você enquanto você sorria. Sua plateia chorou por ela mesma, porque te amava incondicionalmente. Potencialmente, sua oferta ao mundo era gigantesca. Não era mútuo, porém. O que podiam as lousas verdes te ensinarem que não podia o choro-grito melódico de Thom Yorke? Ainda que o mundo fosse mais vasto do que sonhava a sua cabeça bilingue e anormalmente inteligente, você não iria ouvir mais do que saia daqueles fones, não é? E aí você criou um boneco e com palavras-ímã colecionou pessoas-metal. Pessoas que não tinham sua força, sua inteligência. Pessoas que não tinham sua loucura. E foi esse boneco que você viu morrer no retorno da webcam ligada, juntamente com olhos metálicos curiosos que assistiram àquela cena horrorizados e, ainda assim, deliciados. Na porta um último sorriso, o aperto de mão de monóxido de carbono. Não entre! Letal! Você foi frio, porque já estava morto.



"Eu acredito que a cadência e a harmonia certas no momento certo podem despertar qualquer sentimento, inclusive o da felicidade nos momentos mais sombrios." [Yoñlu]