27 de novembro de 2011

Deixar sair

Vou escrever sobre amor porque sinto,
no entanto, dispensarei qualquer bela foto de pôr-do-sol
Vou escrever só porque era ele
porque era eu:

Ou nem nada disso e sim porque
eu era ele era eu
pois só peguei no lápis mesmo
quando era só eu eu eu eu

Lábios óbvios: terei talvez
Olhos órbitas: de vez em quando
Braços omni: me contento do roubo

Sei que há nuvem mais alta e quero
deixe vir platão mas que vá embora logo:
quero me enganar só mais um pouquinho.
Por favor, só mais cinco minutos

Prometo que há lábios, olhos e braços
desses, sério!, de carne, te digo
prometo-lhes esse domingo,
essa segunda, essa terça
essa quinta e se vai

Da obviedade do reflexo do espelho, me consolo:
"é tudo sempre impressão, moça"
E do cara que pouco se importa, um conselho:
"saia da sua mente, moça, antes que seja tarde"

-

I never loved nobody fully
Always one foot on the ground
And by protecting my heart truly
I got lost in the sounds I hear in my mind
[R. Spektor]

21 de novembro de 2011

Eu quero uma pra viver

Pureza de quem conta retirantes,
de quem entrebombas registra
de quem chora e sangra no papel...

Não tenho fome.
Queridos mortos: um ou dois.

Não há tormento o bastante pra expressionismo
e sou mesmo meio sem talentos

Acho que vivo entre
um grito antes da vida e
um grito depois da morte
: não sou movimento

Não sou líder mundial - aos dezesseis, quem é?
nem sou cineasta brilhante - aos dezesseis, quem é?
meus versos são totalmente tortos
e odeio subestima baseada na idade.

sou
semi-comunista semi-atriz
semi-musicista semi-adulta
semi-europeia semi-semítica
semi-culta semi-simpática,

recorro às incertezas
o cotidiano
a imaginação e
a metafísica.

14 de novembro de 2011

Desconstruindo conjeturas

Faz tempo que eu venho esperando uma visita definitiva
Aliás, recentemente diminuí a expectativa: uma visita.
Percebi que antes era fácil,
e talvez um dia volte a sê-lo,
ser presenteado pela vida.
Tê-lo, admirá-lo, rasgar o embrulho e,
às vezes de um minuto ao outro,
notar que a existência é, enfim, outra
diferente da de outrora
diferente até daquela que eu podia fantasiar.

Eu tive uma dessas inspirações divinas pra escrever,
mas não tinha porra de divindade nenhuma nela
na verdade, era só o Pessoa,
e isso significa que eu vou continuar em dúvida.

Não.

Arranjei um drama ou outro
pra temperar a automaticidade dos dias,
deixar a adrenalina correr um pouco e
disfarçar o gosto ruim que fica da rotina.

Mas não.

O máximo que fiz,
e sei que esse foi um auto-presenteamento,
foi constatar que odeio as suposições,
que são, não por acaso, meu maior vício intelectual.

Fomentei, com egoísmo, a ideia de que.
Não, não: fomentei com egoísmo a ideia.
Celebrei a ideia, celebrei o ideal,
celebrei a vontade de pensar,
e o pensamento utópico.
Determinei que, não tivesse meus pensamentos profundos,
ninguém teria nada.
E, então, celebrei a sua negação,
comemorei nas vezes em que ele me contrariava,
e me apaixonei pelas antíteses.
Entendi a delícia do grito e me calei: queria ouvir.

Jogarei no lixo minha nicotina, meu álcool,
cuja versão amena é pior por não ser levada a sério:

"Ele não me serve porque não me pertence.
e não me pertence porque tem um mundo dele inteirinho, ao qual eu não pertenço."

"Friedrich bem disse que seu leitor não deve perguntar se a verdade é útil
e eu disse melhor ainda: é porque ela, se existe e eu a tenho, provavelmente não é."

"Não há mesmo borboletas: é tudo sempre previsível
e quando não se prepara de antemão, não vem a melhor sensação do mundo."

"Eu não vou ser uma dessas pessoas gigantes, cuja opinião converte só por ser
e eu odeio esse tipo de opinião, apesar de querer ser ouvida incondicionalmente."

E por fim, "ninguém nunca vai me ouvir
e tudo bem porque eu não tenho mesmo nada a dizer."

Talvez por isso ninguém me diga nada:
Eu não tenho nada a dizer.