14 de fevereiro de 2012

Bruta flor

Mínima de 18 e máxima de 21 graus celsius hoje na capital.

Uma mão tateia pra fora da sombra e se estende, calculando o sol com a palma pra cima como se faz com a chuva. Não chega a atingir a pele como fez a mesma estrela há tempos: o queimarzinho que precede a vermelhidão, ambos relaxando as pestanas como só o ócio sabe fazer. Em vez disso, o cotidiano joga-se nos olhos, pesado e constante.

Os porquês não caberão nesse texto, salvo os que esbarrarem na paixão, mas estes foram enterrados tão fundo que temo evocar, na verdade, uma grande teia muito pior do que não sentir. Até deixando de lado a apreensão, é pouco visível nos passos dados na rua, no almoço de todo dia e nas conversas burocráticas a luzinha que nunca vai embora, da ação pessoal, da vontade primeira e legítima.

É a mão que estende para o sol querendo a chuva.
É o abraço que supõe o beijo esperado. É a seriedade que pretende o mistério que deseja o interesse que almeja o júbilo... e um milhão de outros processos.

Mas mastigada nas instituições, fatigada pelas distâncias e discrepâncias, enganada e subvertida pelos dogmas impessoais, mantém-se à espera da descoberta e reza pela aventura, pelo total cumprimento ou descumprimento (e por que não os dois? e por que não alternados? e por que não em ritmo frenético?) de sua ideia.

Mais sublime ainda é a inconsciência: quando se tropeça no prazer, já nele mergulha barrando qualquer grito da pretensão e do planejamento, dádiva dos que vivem já durante a queda.

É o espírito jovem e não-cauteloso que escreve-lhes e diz assim:
Deixe o sol desenhar sua chama, deixe-se, ainda, pálido e hipotérmico (não é bonita a endotermia, se é vontade do corpo o calor?), mas, por favor (por favor!) só não deixe a falsa promessa de calma da apatia.

3 comentários:

  1. Que lindo, Mari! Senti as palavras brotarem daqui! :)

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  2. "É a mão que estende para o sol querendo a chuva.
    É o abraço que supõe o beijo esperado" criatividade e talento de poucos. Frase muito bem colocada. O que mais admiro nos seus poemas é o inteligente jogo de palavras feito. São sempre interessantes e dão um ritmo legal ao poema.

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  3. Obrigada!
    E sou fã das vontades profundas, que a gente desconhece. :)

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