26 de maio de 2010

Entrelados

Ela arrumava o cabelo, a roupa e o sorriso. O lado de fora tão seguro e o de dentro, apreensivo. Os olhares todos no alvo cujos olhares, dispersos, nem viam. Aquela mania de fazer caretas e bagunçar o cabelo se expressava nele. E ela quase podia sentí-lo mais perto a cada risada e a cada momento. E isso fazia seu coração bater. O lado de dentro, então, mais apreensivo ainda. Quisera virar-se do avesso e deixá-lo ver inteirinha por dentro: complexa, linda e apreensiva. Tornar-se-ia vulnerável. Tornar-se-ia inocente e a decisão seria só dele. Quisera ver o lado de dentro dele também. Talvez naqueles olhos ela pudesse. Mas, ainda assim, quisera que ele não olhasse pra ela. Não agora. Num movimento gracioso ele sorriu. Ela sorriu junto. Ele, então, virou-se para o lado e a olhou diretamente nos olhos. Ela se assustou, guardou o sorriso e trancou-o bem dentro, quietinho, apreensivo. Ele se levantou e caminhou até ela. Ela, trancada, fingiu escrever qualquer coisa num papel qualquer. Foi tomada por uma sombra: ele já estava bem perto dela, de pé, com aquele sorriso seu conhecido e uma pitada de curiosidade nos olhos. E uma frase que ele disse (quando ela pôde finalmente conhecer sua voz) foi o bastante para ela se abster e deixar o lado de dentro (aquele apreensivo e apaixonado) gritar.

"Te vi me olhando."
"Me vi, te olhando."

2 comentários:

  1. Mari, parabéns! Você está escrevendo a cada dia melhor! E isso está refletido até mesmo nos temas recentes de seus poemas, prosas, contos... :)

    Beijo!

    ResponderExcluir